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Por Manuel Lopes da Costa, Empresário

Por Manuel Lopes da Costa, Empresário

Esperei passar pela experiência de ser vacinado para escrever este artigo. Quis vivenciar o que toda a gente me ia relatando. E, de facto, estamos de parabéns! Estamos todos e, em particular, estão o senhor vice-almirante Gouveia e Melo e toda a instituição militar que representa.

Esta deve ter sido a melhor decisão que este governo tomou, a de nomear, a 3 de fevereiro de 2021 “Vice-almirante Gouveia e Melo é o novo coordenador do Plano de Vacinação contra a covid-19” (in publico.pt). Com esta escolha, passámos a ter um plano altamente profissional. Um plano organizado ao mínimo detalhe, a funcionar às mil maravilhas e sem nada que possa ser imputado à sua concretização. Os centros de vacinação, todos eles sem exceção, funcionam tão bem que, sinceramente, quando foi a minha vez, vi-me obrigado a esfregar várias vezes os olhos e a beliscar-me, para me consciencializar que, nem estava a dormir, nem estava a ser vacinado num país nórdico. Tudo com “conta peso e medida”, sem exageros, mas na medida certa: desde a entrada, onde somos recebidos com gentileza, seguindo-se o preenchimento do impresso em mesas próprias e com canetas estrategicamente colocadas, passando pela zona dos computadores, a que se segue a zona de espera constituída por filas de cadeiras perfeitamente alinhadas. As pessoas são chamadas pela exata ordem em que chegaram — sem ninguém ser ultrapassado, sem chico espertismo — para uns cubículos de tamanho ideal para o ato da administração da vacina. Aí, os enfermeiros repetem, vezes sem conta, o mesmo procedimento, sempre sorridentes, sempre com uma palavra amiga, e fazem, outra e outra vez, as mesmas perguntas e dão os mesmos conselhos, fazendo-nos, no entanto, acreditar, a cada um de nós, que esta é a primeira vez que o fazem. Tudo termina numa sala de recobro, uma vez mais, organizada na perfeição, onde se aguarda, por razões de segurança, os trinta minutos estipulados de verificação no caso de surgir alguma reação adversa. Ao sair das instalações, verifiquei que, ao todo, tinham passado quarenta minutos e que tudo tinha sido, e continuava a ser, sequencial, que ninguém — e éramos muitos — protestou, levantou a voz, disse mal ou criticou fosse o que fosse. Mais: cheguei, bem à portuguesa, em cima da hora, com uns meros cinco minutos de antecedência e, ainda assim, fui vacinado à hora marcada — hora essa que foi registada por uma enfermeira que, orgulhosamente, exclamou: “continuamos a horas!”.

Este é outro país, é algo digno de outro país. Ou talvez não. Na verdade, é a prova provada daquilo que todos sabemos: que os portugueses são os melhores trabalhadores do mundo em locais organizados, com procedimentos claros e precisos. Ora, a competência na execução deste processo, deve-se à instituição militar. Essa instituição, tantas vezes maltratada pela nossa sociedade civil, pelos ideais de alguma esquerda mas não só, tão incompreendida relativamente aos seus valores, procedimentos e disciplina, acabou por dizer “presente!” e fazer a diferença. Não nos podemos esquecer da pouca-vergonha que foi a coordenação do plano de vacinação enquanto esteve a cargo de um civil. Aconteceu de tudo um pouco, nomeadamente situações pouco edificantes ou dignas de um país de outras paragens. Desde o desvio de vacinas sem nexo, ao aproveitamento das ditas sobras por parte de autarcas, membros de instituições de solidariedade social e seus familiares, à vacinação de quem não tinha prioridade por aquela ou outra razão. O plano de vacinação, na altura, seguiu basicamente as leis do faroeste. O pior da nossa sociedade, da nossa mesquinhez, da nossa falta de organização, veio ao de cima sem qualquer esperança de que pudesse vir a ter solução.  Quem não se recorda de notícias como: “Bastonária da Ordem dos Enfermeiros diz que há hospitais e lares onde as vacinas para os profissionais de saúde estão a ser desviadas” (in TSF.pt de 21/01/2021), ou “Há mais um autarca que foi vacinado sem estar no grupo prioritário — “porque havia sobras” (in Observador.pt de 22/’1/2021) ou ainda “Desvio de vacinas. Há novas denúncias de alegados abusos” (in sicnoticias.pt de 02/02/2021).

Estes são alguns exemplos do forrobodó a que todos assistimos até chegar o senhor vice-almirante e vestir o camuflado — que muitos, aparvalhadamente ou ignorantemente, criticaram — e, basicamente, pôr ordem no país relativamente a todo este processo. Não será certamente coincidência que, desde que Gouveia e Melo tomou conta da pasta, nunca mais houve uma única, repito, uma única, notícia sobre desvios, furtos ou manuseamento menos correto das vacinas ou de tudo o que a estas diz respeito. Os meus mais sinceros parabéns senhor vice-almirante! O senhor tem vindo, com a sua mestria e a sua capacidade de organização, a dignificar a instituição militar e o país e a mostrar que, em Portugal, é possível trabalhar com competência até nas circunstâncias mais complicadas. A instituição militar a que pertence, e que se baseia, antes de mais, na disciplina e no respeito (respeito pela hierarquia, respeito pela missão, respeito que cada um tem em realizar na perfeição, e na plenitude, a tarefa que lhe é confiada pela voz de comando — porque, caso contrário, pode colocar em causa a vida de todo um coletivo) é um exemplo que deveria ser seguido por muitas empresas e trabalhadores civis. A disciplina em aceitar cumprir os procedimentos para realizar as tarefas necessárias, tais quais foram idealizadas, e sem imediatamente procurar alternativas com vista ao facilitismo, o facto de aceitar que quem as concebeu e idealizou tem seguramente mais conhecimentos e mais experiência do que quem tem que as implementar, é a base fundamental para conseguirmos, coletivamente, aumentar os nossos índices de produtividade e criar uma sociedade mais respeitadora das missões que cabem a cada um de nós. Portugal tem muito a ganhar com a instituição militar. Com os seus ensinamentos, com os seus valores e, isto, por muito que isso possa custar a admitir por parte de algumas das suas elites.

Ultimamente, dei comigo a pensar que, talvez, tenha sido um erro enorme o ter-se acabado com o Serviço Militar Obrigatório. Talvez não fossem precisos os 18 ou mesmo 22 meses (na Força Aérea e Marinha) obrigatórios como era no meu tempo mas, seguramente, três meses de recruta, a todas as portuguesas e portugueses com 18 anos, fariam muito bem a toda a sociedade. Transmitiriam, entre outros, disciplina, espírito de sacrifício, hábitos de higiene, respeito pelas instituições e pela hierarquia, admiração pela nação e pelos seus símbolos. Tudo valores que temos vindo a perder, eliminados porque, erradamente, o recrutamento militar foi conotado como uma prática pouco vanguardista, senão mesmo revivalista. E, assim, a nossa sociedade perdeu a hipótese de transmitir às suas filhas e filhos um conjunto de valores fundamentais, permitindo que vivenciassem, em sã convivência, vários jovens oriundos de diferentes classes sociais, com graus de escolaridade diferentes, algo que hoje não é nada usual. Estes jovens, durante esse tempo, criariam relações de camaradagem e respeito pelas realidades diferentes de uns e outros, algo que lhes seria certamente muito útil para as suas vidas profissionais. Os futuros líderes entenderiam melhor os seus liderados, assim como os futuros trabalhadores demonstrariam maior respeito pelos seus chefes.

Princípios esses que, como podemos diariamente verificar, nos fazem muita falta. A seriedade, a honestidade, o brio pelo correto e atempado cumprimento de tarefas e missões, é algo que a instituição militar nos pode e deveria transmitir, enriquecendo grandemente a sociedade civil como um todo. E, para tal, bastaria investir três meses de uma vida. Só três meses em que, em vez de, durante esse período, correr para os concertos e os festivais ou fazer Interrail, poderíamos ganhar competências, comportamentos, sentido de responsabilidade e coluna vertebral, tudo o que tanta falta nos faz.

Senhor vice-almirante, não existem palavras para lhe agradecer o que está a fazer pelo país. Se alguém merece uma medalha, a mais alta condecoração nacional, uma Ordem da Torre e Espada, atrever-me-ia a propor ao senhor Presidente da República, que seja o senhor. Se alguém merece uma promoção, e que todos os portugueses entenderiam como justa e merecida, é o senhor. Ganhando dez vezes menos que muitos dos nossos gestores, e de forma sacrificada, sem que nunca se lhe tenha ouvido uma única queixa, o senhor lançou mãos à obra e fez mais pelo país em quatro meses do que muitos alguma vez farão numa vida cheia de privilégios. Se, ao passar na rua, a população reconhecida lhe agradecer, não se espante. Tenha muito orgulho pelo que foi capaz de concretizar num ambiente muito complicado — e sabe Deus com que sacrifícios e contra que marés teve de remar para conseguir que Portugal estivesse a ser vacinado a bom ritmo. E, acima de tudo, honrou a sua corporação, honrou a Marinha, honrou a instituição militar. Parabéns, tornou-se um verdadeiro exemplo, uma referência para todos nós.

Publicação a pedido do Presidente da Direcção A.A.A.C.M
Filipe Soares Franco 62/1963
ZacatraZ

 

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